sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Tribunais fiscais exigem mais meios

Falta de meios, juízes a menos, excesso de processos parados, cidadãos e empresas que não conseguem cobrar as suas dívidas ou que foram alvo da cobrança indevida de impostos. É um cenário pouco animador que reflecte o estado da justiça administrativa e fiscal, e que ontem foi descrito pelo novo presidente do Supremo Tribunal Administrativo, durante a tomada de posse.

Lúcio Alberto Barbosa, que ontem sucedeu a Santos Serra, discursou perante todos os altos representantes da justiça e não poupou nas palavras para pedir mais e melhores condições para os magistrados que trabalham com processos administrativos e tributários.

“Há uma gritante falta de meios”, assumiu o responsável, sublinhando que nestes processos, estão em causa questões económicas que podem por em causa a viabilidade de muitas empresas e as garantias dos cidadãos. No final do ano passado, estes tribunais tinham mais de 39 mil processos pendentes só sobre matérias fiscais, que representam mais de 13 mil milhões de euros em litígios.

Para Lúcio Barbosa, é importante que o poder político tome medidas para evitar esta “grave e insanável pendência processual na área tributária”, porque, lembra o magistrado, “é a nós que o cidadão comum pede explicações responsabiliza por esse falhanço”.

Na lista de recados que o novo presidente deixou, fica também a mensagem de profundo desagrado contra quem tem atacado a autonomia e independência “não faltam vozes que, pretendem limitar a nossa autonomia com o argumento de que os magistrados `estão em roda livre, estão sem qualquer controlo”‘, e terminou dizendo que sobre esta questão “vivemos tempos turvos”.


FONTE:
SUSANA REPRESAS | DIÁRIO ECONÓMICO | 17.12.2009

Finanças afastam director de Lisboa


O director distrital de Lisboa foi ontem afastado de funções depois de sete anos à frente da mais importante direcção de Finanças do País, que responde por 40% do total da receita fiscal . Manuel Marcelino, antigo chefe de gabinete de Dias Loureiro, foi chamado de manhã ao gabinete do director-geral dos Impostos, onde lhe foi comunicado que já não era director distrital. Azevedo Pereira afirmou que o despacho de afastamento produzia efeitos imediatos e que o novo responsável já estava escolhido.


A notícia causou um grande mal-estar entre os funcionários de Lisboa e muitos subdirectores distritais manifestaram ao CM a intenção de abandonar as suas funções em Lisboa, em solidariedade com o director afastado.


Segundo apurou o CM as razões invocadas por Azevedo Pereira para substituir Marcelino foram o facto de não ter atingido os objectivos em relação à receita executiva e de não ter cumprido os prazos de tratamento das reclamações graciosas. Estes fundamentos são contrariados por elementos da direcção de Lisboa que, contactados pelo CM, adiantaram que a cobrança executiva global irá cumprir os objectivos definidos (1250 milhões de euros) no início do ano, e que os montantes do distrito de Lisboa têm um desvio mínimo. Em relação ao tratamento das reclamações graciosas, primeira linha de defesa do contribuinte, o objectivo de tratar 90% das reclamações feitas em 2008 foi atingido e, para 2009, o prazo de tratamento das reclamações recebidas estava nos 90 dias, o que também cumpre os objectivos definidos.


Manuel Marcelino foi nomeado director de Finanças por Manuela Ferreira Leite, em 2003, após os casos de corrupção denunciados pela publicação anónima o ‘Borda d’Água’ e pelo caso Lanalgo que envolveu alguns altos-responsáveis do Fisco. A então ministra das Finanças uniu as duas direcções distritais da capital numa superdirecção com poderes reforçados.


PORMENORES


QUEDA DAS RECEITAS


A quebra da receita fiscal até Outubro era de 14,1%. É na cobrança voluntária de IRC que se regista a maior diminuição.


RECURSOS HUMANOS


A subdirectora-geral responsável pelos Recursos Humanos, Joana Santos, também não foi reconduzida e optou por se reformar.


SANTARÉM


O director distrital de Finanças de Santarém, Mário Januário, será o novo director distrital de Finanças de Lisboa já a partir de hoje.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Gestor de falências liderava rede de fraudes


Operação "Paella" detecta 30 milhões em fugas ao Fisco no negócio da importação de marisco. O alegado cabecilha da rede criminosa que foi alvo de 78 buscas, anteontem, por enganar o Estado em negócios de mariscos importados, era tido pelo Ministério da Justiça como um qualificado administrador de insolvências.
As autoridades têm Feliciano Marmelada como o "mentor" de um complexo esquema de fraude fiscal, nomeadamente com "carrossel de IVA", que já terá lesado o Estado em pelo menos 30 milhões de euros, desde 2004. Mas, num documento publicado, precisamente, há cinco anos, a Comissão de Apreciação e Controlo da Actividade dos Administradores de Insolvência, do Ministério da Justiça, depositou a maior confiança no principal arguido do processo "Paella".
Na lista dos administradores da insolvência do distrito de Évora, Feliciano Marmelada é apresentado como um gestor de insolvências "especialmente habilitado a praticar actos de gestão", tanto em processos de recuperação de empresas em dificuldades, como na venda de património de empresas já falidas. Mas, além de sócio da Associação Portuguesa de Gestores e Liquidatários Judiciais e dos Administradores de Insolvência, o suspeito é ainda membro da Câmara de Técnicos Oficiais de Contas.
Numa megaoperação de buscas, noticiada ontem pelo JN, a Polícia Judiciária (PJ) recolheu milhares de documentos em empresas de Marmelada que tinham real actividade económica, como a Duenasmar, Gelup e Ocealis, mas também em largas dezenas de outras empresas que apenas simulavam transacções comerciais. A Bemposta & Pires é outra das grandes empresas com verdadeira actividade visadas pelas buscas, que também tiveram lugar em habitações.
A maioria das 78 buscas teve lugar em Lisboa, mas também decorreram no Norte do País (cerca de dezena e meia, sem arguidos constituídos) e em outros pontos do país. Foram detidas oito pessoas, por suspeitas de associação criminosa, fraude fiscal e burla qualificadas, branqueamento de capitais e falsificação de documentos. Já há dez arguidos constituídos, mas este número deverá aumentar.
Em comunicado, a PJ informou, ontem, que também foi apreendida grande quantidade de documentação, computadores, carimbos, uma viatura, cinco armas de fogo e os saldos de outras tantas contas bancárias. Participaram 318 homens, incluindo membros da ASAE, que apreendeu duas toneladas de pescado.
Os suspeitos visados pela operação, conduzida pela Unidade de Combate à Corrupção da PJ , pertenceriam a uma organização de cariz transnacional, que inclui países europeus, sul-americanos e africanos. Essa organização importava mariscos da Índia, Moçambique e Nigéria, que entravam na União Europeia a partir dos portos espanhóis de Vigo e Algeciras.
Para isso, diz a PJ, "montaram uma estrutura complexa, formada por diversas empresas, num emaranhado de transacções comerciais, muitas delas simuladas, de contas bancárias e de circulação de dinheiros". "Muitas dessas empresas estavam falidas, cessadas ou sem actividade substancial, estando quase todas em situação de incumprimento dos seus deveres para com a administração fiscal", acrescentou. Algumas empresas "eram controladas através de testas de ferro".
Estão em causa três inquéritos, do DCIAP e do DIAP e Lisboa. E, num deles, são investigados contratos de seguro de crédito, que levavam algumas empresas a simular transacções comerciais e a participar falsos sinistros, que ascendem a mais de um milhão de euros
FONTE:

Administração fiscal ignora decisões dos tribunais

Quantas decisões judiciais são necessárias para que a administração fiscal adopte nas suas circulares internas o entendimento dos tribunais? O Ministério das Finanças não tem "um critério quantitativo", refere uma nota oficial. Em resposta ao PÚBLICO, o Ministério das Finanças esclarece que o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais "altera a interpretação" do fisco a partir das decisões dos tribunais "sempre que tal se afigura justo e correcto e sempre numa lógica abstracta".


A questão não é de somenos. Há uma importante litigância nos tribunais tributários por recurso de contribuintes que tentam fazer a administração fiscal aplicar a jurisprudência dos tribunais. Desconhece-se qual a parte dos dez mil processos que entram anualmente nos tribunais tributários. Mas o próprio relatório do Grupo de Trabalho para o Estudo da Política Fiscal, encomendado pelo Ministério das Finanças e coordenado por António Carlos dos Santos e António Ferreira Martins, refere o problema.


"Verifica-se frequentemente a necessidade" de os contribuintes "reagirem contra petições indeferidas na via graciosa, quando foram já emanados vários acórdãos pelo Supremo Tribunal Administrativo a dar provimento a pedidos semelhantes". E isso quando os próprios contribuintes "invocam expressamente os acórdãos em questão". Com essa atitude, "agrava-se (...) o tempo de decisão do processo gracioso e onera-se o Estado, devido ao recurso à via judicial, em situações perfeitamente desnecessárias". Para tal, o grupo de trabalho sugeriu que "deve a jurisprudência já firmada ser analisada pela administração tributária e por esta assumida e superiormente veiculada, sendo reconhecida e evitando-se recursos inúteis à via judicial".


Ora, a questão que o PÚBLICO colocou ao Ministério das Finanças é como se explica que haja situações em que basta uma decisão de um tribunal para que o fisco mude de opinião (ver caixa), enquanto outros casos, apesar de sucessivos acórdãos dos tribunais num mesmo sentido, nada se altera? É o que se passa com a compensação de reembolsos de IVA, cúmulo jurídico em coimas, certificação da residência fiscal para efeitos da aplicação dos Acordos para evitar a dupla tributação. Qual é o critério?


Justificações oficiais


O Ministério das Finanças começou por esclarecer que a decisão no caso do Imposto Municipal sobre a Transmissão de Bens Imóveis (IMT) relacionado com um hipermercado (ver caixa) foi "compatível com os princípios do IVA, conforme entendido pela doutrina e pela jurisprudência comunitárias" e que ia no sentido já sugerido pela Inspecção-Geral de Finanças (IGF). "A Direcção-Geral das Contribuições e Impostos (DGCI) pauta-se por princípios de legalidade e age sempre no convencimento de que a sua actuação se coaduna com as normas legais em vigor, sem prejuízo de poder adoptar a jurisprudência dos tribunais", referiu-se.


Insistiu o PÚBLICO. Qual a razão para uma alteração de posições tão radical por parte das autoridades num tão curto espaço de tempo? A primeira nota da DGCI é de 16 de Abril de 2009, a sentença do tribunal que a contrariou de seis dias depois (22 de Abril de 2009), sendo o despacho do secretário de Estado que seguiu o tribunal de 1 de Junho de 2009. O que se passou neste caso? "Esta questão", continua a resposta oficial, "foi acompanhada sempre de perto" pelo então secretário de Estado (Carlos Lobo). "Não foi por causa do caso concreto, mas devido a uma orientação geral que o secretário de Estado decidiu pela forma que considerou mais justa e correcta".


Mas qual é o critério geral? Quantas decisões no mesmo sentido são necessárias para que a administração fiscal a adopte? "O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais altera a interpretação sempre que tal se afigura como justo e correcto e sempre numa óptica geral e abstracta", refere a nova resposta. "Não há qualquer critério quantitativo. O único critério é o da justiça, ponderadas as questões em apreço". Isso quer dizer que, caso haja várias sentenças no mesmo sentido, sem que se verifique alteração do entendimento oficial, isso é porque se considera não ser "justo e correcto"?


"O secretário de Estado da tutela não faz juízos de valor sobre as sentenças e manda cumpri-las quando elas têm de ser cumpridas", refere a nota do Ministério das Finanças sem dar muitas explicações. "Mas também não aguarda sempre pelas sentenças. Dá as orientações que lhe parecem ser as melhores à administração fiscal, tendo sempre em conta o interesse público e salvaguardadas as garantias dos contribuintes".

FONTE:
Publico